Tânia Spindler, 34 anos de idade, recordista brasileira dos 10 e dos 20 quilómetros marcha, encontra-se em Portugal e deu uma entrevista exclusiva ao nosso portal. Eis a atleta, na primeira pessoa:
Breve currículo atlético:
• 4.º lugar nos Jogos Panamericanos do Rio de Janeiro, Brasil, 2007
• 30.º lugar no Campeonato Mundial de Osaka, Japão, 2007
• 23º lugar na Taça do Mundo de Cheboksary, Rússia, 2008
• 37.º lugar nos Jogos Olímpicos de Pequim, China, 2008
• 1.º lugar na Taça Pan Americana de Marcha Atlética de San Salvador, El Salvador, 2009
• 20.º lugar no Campeonato Mundial de Berlim, Alemanha, 2009
• 34.º lugar na Taça do Mundo de Chihuahua, México, 2010
• Circuito Mundial de Marcha Atlética: 9 participações. Melhor posição: 6.º lugar, na 4.ª etapa do Circuito Mundial de Marcha de Sesto San Giovanni, Milão, Itália, 2008
• Participação nos Iberoamericanos de atletismo de San Fernando, Espanha 2010 e de Iquique, Chile 2008.
• Participações em vários Campeonatos Sul-Americanos de Atletismo das categorias menores, juvenil e adulto
Recordes:
• Recordista brasileira dos 20 km marcha atlética: 1h33:23
• Recordista brasileira dos 10 km marcha atlética: 45:55
• Recordista brasileira dos 10 km marcha atlética em pista: 46:10.0
• Recordista brasileira juvenil nos 5.000 m marcha atlética: 23:57.2 - 1995
• Recordista brasileira menores nos 3.000 m marcha atlética: 14:27.7 – l993
- Iniciou-se na prática da marcha atlética, em 1990. Porque escolheu esta modalidade, dentro do atletismo? Anteriormente, já tinha praticado algum desporto?
- Sim, comecei em 1990, fazia corridas de rua. Fui para a marcha quando meu treinador quis que eu participasse de uma competição de iniciação.
- Sempre existiram muitos preconceitos para com os praticantes de marcha atlética, principalmente para os atletas femininos. Pode contar--nos alguma situação mais complicada e/ou divertida pela qual tenha passado?
- No Brasil, onde vivo, o preconceito é tanto com homens, quanto com as mulheres. Em meu país, a marcha é pouco praticada. Então, quando estou treinando em parques coloco um auscultador (fone de ouvido) para não ouvir algumas pessoas que ficam me fazendo bromas. Isso me irrita. Várias vezes, parei para explicar o que eu estava fazendo.
- Até ao momento, o ponto alto da sua carreira foi a participação nos Jogos Olímpicos de Pequim/2008. O que sentiu, aquando dessa sua presença no Oriente?
- Mesmo chegando em 37.º lugar, para mim, foi uma vitória, por ser minha primeira Olimpíada e por ter tido tantas dificuldades por falta de patrocínios em toda a minha carreira atlética
- Fale-nos um pouco sobre a sua carreira.
- Comecei em 1990, em uma pequena cidade do estado do Paraná, sul do Brasil. Depois que comecei a treinar marcha atlética, passei a participar de muitas competições e a quebrar recordes nacionais de diversas categorias, desde menores até juvenis. Ao chegar na categoria de adulto (sénior), as coisas ficaram difíceis. Tinha pouco dinheiro. Então, parei, em 1996. Em 1998, tive minha primeira filha, Carolina, hoje com 13 anos. Voltei em 2002, mas sem muitas condições de treinamento, participando apenas de competições nacionais. Em 2005, tive minha segunda filha, Maria Vitória, que tem 6 anos. Voltei a competir em 2006. Desta vez, consegui alguns patrocínios e passei a me dedicar mais aos treinamentos. Em 2007, participei da minha primeira competição em Portugal, o Grande Premio de Rio Maior. Em seguida, fui para a Itália onde obtive o índice (mínimo) para participar do Campeonato Mundial de Atletismo de Osaka. Depois disto, voltei várias vezes a Portugal, onde fiz ótimos amigos, alguns que até foram me visitar no Brasil. A partir daí, vieram índices para outros mundiais, copas do mundo e as Olimpíadas de Beijing. Atualmente, participo de treinos e competições com o apoio de minha equipe, a BMF/BOVESPA, um clube de atletismo de São Caetano do Sul, cidade do estado de São Paulo, e de alguns amigos da cidade em que moro, São José dos Pinhais, estado do Paraná, no sul do Brasil.
- No atletismo, quais são os seus objetivos para esta época? E no futuro a curto prazo, espera competir em Londres/2012?
- Meu objetivo é a obtenção do índice para Londres/2012. No Brasil, foram estabelecidos índices mais fortes que os da IAAF. Para ir aos Jogos, tenho que marchar os 20 km abaixo de 1h31.30, mais forte que os índices para as portuguesas, é na media do 12.º lugar das três últimas grandes competições mundiais, Olimpíada de Beijing, Mundial de Berlin 2009 e Mundial de Daegu 2011. É assim para todas as provas no nosso atletismo.
Portanto, para ir a Londres, terei que fazer minha melhor marca pessoal, quebrando o Recorde Nacional do Brasil, que é meu e que é minha melhor marca, 1h33.27.
- Quando abandonar a alta competição, o que fará?
- Sou formada em Educação Física. Em breve, começarei a trabalhar em escolas e com treinamento de iniciação no atletismo.
- Pensa que o aperfeiçoamento técnico é o principal fato, para se ser um bom marchador ou existem outros fatos que possam fazer com que um marchador chega à "alta roda" mundial?
- Sem dúvida, a obtenção de grandes resultados e grandes marcar vão depender da qualidade técnica do atleta, mas, esta qualidade de nada adiantará, se o atleta não desenvolver uma ótima condição psicológica. O grande atleta, por sua vontade de vencer, consegue se concentrar para superar a dor, o que o torna altamente competitivo.
- Em média, quantos kms semanais treina? Como é a sua alimentação? Que outros cuidados tem, na sua preparação?
- A quilometragem semanal vai depender das fases do treinamento, normalmente, gira em torno de 120 km semanais. Para isto, minha alimentação é baseada em carboidratos, com a intenção de obter muita energia para cumprir os treinamentos e as competições, mas, não pode faltar os legumes e verduras, que gosto muito. Adoro carne, principalmente o churrasco brasileiro, mas, tenho que comer pouco, pois traz muitos problemas com o peso.
- Em Portugal e, também, noutros países, a marcha atlética parece ser "um mundo à parte", em que existem fortes relações de amizade entre atletas, técnicos, familiares, etc. Partilha dessa opinião? Como é a realidade da marcha atlética, no Brasil?
- No Brasil, é assim também, é meio familiar. Eu, por exemplo ,sou casada com meu treinador, Irineu de Oliveira. Outras atletas também são casadas com seus treinadores, alguns são filhos de ex-atletas. Somos todos amigos, mesmo morando a grandes distâncias dentro do Brasil, que é enorme. Para superar as dificuldades que temos, às vezes, um ajuda o outro, participando de estágios juntos e se apoiando nas competições.
- Portugal é reconhecido como uma das "potências" mundiais da marcha feminina. É frequente, vermos muitos atletas estrangeiros a estagiar e a competir em Portugal. No seu país, como é encarada a marcha atlética portuguesa?
- Consideramos Portugal como uma das potências da marcha e como nossa referência. Por isto, estou estagiando atualmente aqui e já estive outras vezes. Outros atletas brasileiros também procuram vir sempre para cá. Além disso, fizemos bons amigos aqui, e a língua ajuda muito. Para nós, Portugal é nossa pátria mãe, nos orgulhamos muito disto.
- Recentemente, esteve presente na Légua de Santo António dos Cavaleiros. Como surgiu essa oportunidade? Vai estar entre nós durante algum tempo mais?
- Estive na Légua de Santo Antonio, pois acompanhei os atletas de Rio Maior pois estou treinando, no centro de estágios, com o auxilio do Sr. Jorge Miguel, treinador de grandes marchadoras e marchadores portugueses. Estarei treinando aqui até 15 de dezembro, passarei as festas de final de ano com meus familiares, retornando a Portugal no meio de janeiro, para participar dos treinamentos em Rio Maior, algumas competições portuguesas e acompanhar o grupo treinado pelo Sr. Jorge Miguel a estágios em altitude, nos Estados Unidos e Espanha.
- Desportivamente, quem são os seus ídolos? E, na vida?
Uma grande marchadora brasileira, Gianete Bonfim, e as portuguesas Susana Feitor, Inês Henriques e Ana Cabecinha. Na vida , meu pai, Auri Spindler e minha mãe, Maria Helena.
- Que mensagem quer deixar a todo/as que lêem esta entrevista?
- Fico muito feliz em poder estar treinando e competindo em Portugal, junto com grandes nomes da marcha atlética mundial. Adoro ver as provas onde tem muitos miúdos participando. Sempre fui muito bem recebida aqui, acho as cidades lindas, a comida muito boa, as pessoas muito educadas e tudo muito organizado. Vivo em um país muito grande, que tem uma população de quase 200 milhões de habitantes, que tem grandes cidades e que possui muitas belezas naturais. Estamos experimentando um grande desenvolvimento, podem ter certeza que coisas negativas sobre o Brasil, que algumas vezes aparecem em noticiários, como a violência, estão concentradas em poucos pontos. Somos muito pacíficos e alegres. Tenho certeza que todos serão muito bem recebidos, quando vierem ao Brasil tanto a passeio (férias), quanto para a Copa do Mundo de Futebol em 2014 e aos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro em 2016.
Entrevista conduzida por José Duarte