A Corrida que não fiz- Grande Prémio do Atlântico

Domingo, 25 de Fevereiro, saio de casa às 9h 15min, rumo à Costa de Caparica e ao Grande Prémio do Atlântico.
 
Manhã amena, embora húmida e ameaçadora de chuva. De vez em quando, os castelos fofos de tonalidade metálica, deixam vislumbrar um pedaço de céu azul, como pano entreaberto num palco não revelado.
É maravilhosa a paisagem sobre a Costa…estendendo-se, lá em baixo, num convite mudo de contemplação. Prefiro ignorar as altas construções que se impõem a meus olhos e deleitar-me apenas no vaivém das ondas que se quebram na praia. Naquele momento, nada mais existe para além da beleza natural deste pedacinho do meu país. O olhar perde-se no horizonte, acompanhando os recortes da costa como curvas em corpo de mulher…O Atlântico faz ouvir a sua voz, hoje não com rugidos ferozes e agrestes, mas numa canção que poderia bem ser de embalar…suave…subindo de intensidade…suspendendo a voz….envolvendo…e…finalmente libertando toda a emoção numa dança íntima na areia…desfazendo-se em espuma suave e recomeçando aquele bailado incansável…
Comecei a descer até à povoação.
Costa de Caparica, nome nascido de lenda magnânime, de tempos antigos, terra como manta de retalhos… serra e mar. O mar da Costa é bravio, altivo, incontrolável, outras vezes meigo, suave, fraterno…mar, fonte de pão e mar última morada.
 
Grande Prémio do Atlântico. Que nome mais sugestivo e adequado para a prova que iria acontecer. O Atlântico atrai e atraiu à prova mais de mil atletas.
Aquecimento feito, dorsais postos, tudo em ordem, todos em posição…o estampido do tiro fez-se ouvir e lá partiram à desfilada homens e mulheres, como se inebriados pelo apelo do mar, a ele se fossem lançar em correria louca.
Eu fiquei. Mas parti com eles.
Emocionei-me. Na primeira linha, partiram dois atletas com guias. Soltando um brado forte, libertando toda a energia contida, lançaram-se para frente e eu fiquei sem saber, qual dos dois, em cada par, é mais feliz quando parte e qual dois é mais feliz quando chega. Vencer, vencem ambos. Porque não desistem, porque estão para além das limitações impostas. É indissolúvel a vitória, o sucesso, o esforço, o cansaço, talvez o desânimo, por vezes… quem sabe?
Os guias treinam à chuva, ao vento, ao calor e ao frio apenas para serem os olhos de quem não vê. Poderá haver maior abnegação?
 
No meu lugar, bem junto à linha da Meta, aplaudi, incentivei e elogiei todos quantos ali passaram. Contagiei alguns dos que assistiam, fizemos a festa da assistência, festa não para nós, mas para os outros. Quem fica para aplaudir o esforço dos que correm e partilhar o prazer sentido nesse esforço, também é uma forma de doação. É apenas mais uma gotinha de água, na imensidade de tudo quanto faz de uma corrida um sucesso.
Não saí do mesmo sítio. Não senti o suor escorrer pelo rosto. Não tive um tempo para cronometrar. Ainda assim, senti-me parte do Grande Prémio do Atlântico. E quando a prova acabou, a mesma chuva que principiou a cair em cima dos corpos quentes dos atletas, foi a mesma chuva que molhou os meus pés frios.
Pertenço ao mesmo mundo. 
 
Ana Paula Pinto

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